Felipe Melo foi uma das principais contratações do Palmeiras para a temporada 2017. Titular da seleção brasileira na Copa de 2010, o volante chegou à equipe alviverde após passagens de relevo por algumas das principais equipes do futebol europeu (Inter de Milão, Juventus e Galatasaray, por exemplo), com proposta de agregar ao elenco um combo de experiência, espírito guerreiro e qualidade na saída de bola. Em muitos aspectos, era uma mudança de perfil em relação ao que existia no clube durante a campanha vitoriosa no Campeonato Brasileiro do ano anterior. Na noite da última sexta-feira (29), essa aposta acabou de forma desastrosa. Em meio a uma sucessão de erros no processo de comunicação, o jogador foi afastado pelo técnico Cuca e liberado para procurar outra equipe.
No sábado (30), depois de o Palmeiras ter batido o Avaí no Allianz Parque, Cuca fez um pronunciamento sobre Felipe Melo. Disse que o volante não se adequa às ideias de jogo do comandante e que sua personalidade poderia se transformar num problema se ele ficasse fora dos planos da equipe. O meio-campista tem apenas cinco partidas no Campeonato Brasileiro e ainda pode reforçar outro time da primeira divisão.
Toda a condução do caso Felipe Melo diz muito sobre uma característica desse Palmeiras: impulsionado pelo dinheiro oriundo da Crefisa e do ex-presidente Paulo Nobre e alicerçado na sanha do diretor-executivo Alexandre Mattos, o time alviverde tornou-se um dos brasileiros mais ávidos no mercado da bola. Desde o começo de 2015, contrata e dispensa num volume assustador. Reforços viraram a resposta para tudo, e isso criou um senso de urgência assustador.
Com dinheiro e reforços, criou-se no Palmeiras a sensação de que o time precisa aproveitar o momento e colecionar títulos. É essa a ideia propalada por torcedores, imprensa, conselheiros e até dirigentes da equipe há três temporadas. O time vive sob pressão de conquistas e entende o mercado como solução para tudo. Se claudica ou percebe instabilidade em qualquer competição, corre às compras.
Foi essa a lógica que fez com que o Palmeiras contratasse e depois abandonasse jogadores como Erik, Rafael Marques, Arouca, Lucas Barrios e Borja. Também é esse raciocínio que minou o espaço de jogadores como Fernando Prass e Victor Hugo, que em poucos meses trilharam o caminho entre destaques do time titular e opções no banco de reservas.
Tudo no Palmeiras é urgente. Também foi por isso que o time desistiu em poucos meses de Eduardo Baptista, treinador que havia sido contratado para o início desta temporada. Quando ele foi demitido, a diretoria recontratou Cuca, campeão brasileiro no ano anterior, que havia saído por questões pessoais. Se era necessário ter uma resposta em pouco tempo, nada melhor do que alguém que já conhecia o ambiente e contava com apoio dos torcedores.
No entanto, o período em que Cuca ficou distante mudou o Palmeiras em aspectos basilares. É o caso da contratação de Felipe Melo: o volante tem um perfil radicalmente diferente das ideias que o treinador tem para a posição. Além disso, carrega aspectos comportamentais complicados para um gestor de grupo: é extremamente competitivo, explosivo e pouco racional.
O diagnóstico se assemelha muito ao do Flamengo, outro time brasileiro que investiu muito nos últimos anos. É essa lógica imediatista que fez com que o time carioca tivesse três goleiros diferentes no Campeonato Brasileiro de 2017 – o último é Diego Alves, contratado do Valencia, que estreou no último domingo (31).
Quando o Campeonato Brasileiro começou, o Flamengo tinha Alex Muralha, goleiro que havia sido convocado por Tite para a seleção brasileira. Em pouco mais de três meses, virou a terceira opção do elenco comandado por Zé Ricardo.
Em times que mudam tanto e com tanta velocidade, como um jogador pode ter confiança e trabalhar sem o medo de perder espaço a qualquer erro ou instabilidade? Jogadores são profissionais como qualquer outro, e por isso estão sujeitos a questões como problemas pessoais ou apenas irregularidade. Os times brasileiros estão preparados para lidar com isso?
Existe um contraexemplo no Campeonato Brasileiro. A diretoria do Corinthians até tentou desistir de jogadores contratados recentemente, como Giovanni Augusto e Marquinhos Gabriel, mas o técnico Fabio Carille bancou ambos e disse que preferia tentar recuperá-los. Nenhum se consolidou como titular ou virou destaque da competição nacional, mas os dois contribuíram em ocasiões específicas e ajudaram a explicar a regularidade do campeão do primeiro turno.
O episódio Felipe Melo tem uma série de erros de comunicação. Cuca foi mal ao tentar dizer que a explicação era apenas tática e foi pior ainda ao não conseguir um acordo com um jogador de bom nível. Do jeito que ficou, o discurso do treinador pareceu intransigente e colocou pressão sobre o restante do elenco. A partir de agora, quem não cumprir exatamente as determinações de posicionamento do comandante correrá enorme risco de não seguir no clube.
Contando apenas o período no Palmeiras, Cuca já teve problemas com pelo menos cinco jogadores por falta de adaptação às propostas táticas que ele tentou impor. Da lista, nomes como Barrios e Felipe Melo acabaram preteridos. Outros, como Borja e Michel Bastos, seguiram no elenco a despeito de não fazerem parte dos planos do comandante.
Cuca ainda jogou pressão sobre o próprio trabalho. Se o Palmeiras não passar pelo Barcelona no dia 9 de agosto, na partida de volta das oitavas de final da Copa do Brasil, como o técnico vai justificar a briga que comprou com a própria diretoria? Se Felipe Melo era o problema e o problema foi resolvido, o que ele vai alegar agora?
A sensação é que Cuca se colocou numa posição de extremo risco. Se o Palmeiras for eliminado da Libertadores, sobretudo em um ambiente tão imediatista, o clima para o treinador vai ficar complicado. Além disso, outras certezas serão geradas daqui até o fim da temporada. Dependendo dos resultados, outros nomes podem virar fracassos ou culpados da vez.
Todo o atual momento do Palmeiras foi montado sobre erros de comunicação. Todas as convicções da equipe são imediatistas e não se sustentam diante de adversidades. Se o time não sabe bem o que quer ou muda de desejo a cada sopro do vento, como montar um projeto vitorioso ou instituir no elenco uma cultura vitoriosa? No futebol, como em qualquer outra seara, tudo é sobre tempo.
Não é errado um técnico achar que um jogador não serve mais. Não é errado um time mudar ou tentar antecipar problemas. Errado é comunicar isso como se tudo fosse tão descartável e tantas mudanças consecutivas não atrapalhassem todo o processo de comunicação. Não se faz futebol com pressa.
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Fonte: Universidade do Futebol
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